As incertezas no mercado internacional de soja — reflexo da guerra tarifária entre Estados Unidos e China — têm deixado os produtores brasileiros mais cautelosos na hora de fechar vendas antecipadas da safra 2025/26, cujo plantio está em andamento no país. O ritmo de comercialização está atrasado em relação ao mesmo período do ciclo passado, já que muitos agricultores apostam em melhores preços à frente.
De acordo com levantamento da Safras & Mercado, até setembro apenas 20,18% da produção esperada havia sido negociada. O índice está abaixo da média dos últimos cinco anos, de 28,12%. “O produtor segura a safra para tentar conseguir um preço melhor lá na frente, diante das incertezas da guerra comercial”, avalia o analista Rafael Silveira.
Pelos cálculos da consultoria, no acumulado até agosto a China importou 65,92 milhões de toneladas de soja do Brasil, volume 8% maior do que no mesmo período de 2024. Já os Estados Unidos embarcaram 22,4 milhões de toneladas, queda de 7,8%. A demora da China em buscar grãos norte-americanos tem sustentado a demanda pelo produto brasileiro.
A Céleres Consultoria estima que as vendas antecipadas estejam em 25% da safra, dez pontos percentuais abaixo da média. Para o analista Enílson Nogueira, além da guerra tarifária, a oscilação cambial pesa na decisão do produtor. “Temos hoje um dólar em torno de R$ 5,40, mas que já esteve em R$ 5,60, oferecendo margens melhores. Essa incerteza faz o produtor esperar a melhor hora para negociar”, explica.
Na avaliação de Ênio Fernandes, da Terra Agronegócios, o ritmo poderia estar em 30%, não fosse a queda recente nos preços internacionais da oleaginosa. “Para muitos, a conta não fecha. Então esperam alta em Chicago ou valorização do dólar para fechar as contas”, diz.
Em Mato Grosso, maior estado produtor do país, a situação também reflete cautela. Segundo a Brandalizze Consulting, apenas 22% da safra foi comercializada, bem abaixo da média histórica de 35%. O consultor Vlamir Brandalizze alerta para o risco de concentração de vendas na colheita. “Se deixar muita soja para vender na boca da colheita vai ter queda no preço”, projeta.
Enquanto consultorias apontam atraso, algumas empresas seguem em linha com a média histórica. A BrasilAgro já negociou 48% da produção esperada, percentual considerado dentro do padrão. “A venda antecipada era para estar em mais de 40% no Brasil e está em torno de 30%. Muitos produtores seguraram, confiando em prêmios mais altos”, explica André Guillaumon, CEO da companhia.
O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) estima a produção americana em 116,82 milhões de toneladas, 1,7% menor que no ciclo anterior. Caso Washington e Pequim cheguem a um acordo, parte da demanda chinesa pode voltar para os EUA, reduzindo a pressão de compra sobre o Brasil.
Enquanto aguardam definições no cenário internacional e monitoram o câmbio, os produtores brasileiros seguem em compasso de espera. O desafio será equilibrar a busca por melhores preços com o risco de um excesso de oferta no mercado interno durante a colheita.