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Em meio a tarifaço dos EUA, Brasil foca abertura do mercado japonês à carne
Setor esperava autorização a todo país, mas Tóquio sinalizou que só Estados do Sul, com status de livre de aftosa sem vacina antes de 2025, devem ser incluídos
Publicado em 07/08/2025 08:15
Boletim
Luis Rua diz que governo vai defender a abertura a todo o Brasil, mas não vai recusar a possibilidade de aval parcial — Foto: Globo Rural

Por Rafael Walendorff— Brasília

 

O setor frigorífico brasileiro espera avanços nas tratativas do governo para abertura do Japão para a venda de carne bovina ainda neste ano. Com a guerra tarifária em curso e o Brasil no centro das sanções americanas, que podem tirar US$ 1 bilhão de faturamento das exportações do produto apenas em 2025, empresários avaliam que o acesso ao mercado japonês se tornou ainda mais estratégico.

O Japão, que importa 700 mil toneladas de carne bovina ao ano, sinaliza que apenas Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul poderiam receber o aval. O setor esperava que todo o país fosse contemplado depois de o Brasil receber, em maio, o reconhecimento de livre de febre aftosa sem vacinação da Organização Mundial de Saúde Animal (OMSA), principal exigência dos asiáticos. As negociações com Tóquio duram mais de 20 anos. A preocupação agora é que frigoríficos dos demais Estados fiquem no “limbo”, sem previsão de data para abertura.

O processo documental da região Sul está mais avançado do que o restante do país. Produtores nacionais querem que todo o território seja atendido ou, ao menos, Estados com maior peso na pecuária, como Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Pará e São Paulo. O setor fez chegar ao governo que a eventual abertura parcial significaria uma “restrição injustificável” às empresas do restante do país.

As exportações de carne bovina dos três Estados da região Sul em 2024 somaram 98,4 mil toneladas, apenas 3,5% das mais de 2,8 milhões de toneladas embarcadas para vários destinos. Os principais exportadores do país foram São Paulo (638,8 mil toneladas), Mato Grosso (624,2 mil toneladas), Goiás (386 mil toneladas) e Mato Grosso do Sul (282,2 mil toneladas), segundo dados do Agrostat do Ministério da Agricultura.

Empresários buscam interlocução com governos estaduais para pressionar pela autorização mais ampla. Alguns têm defendido que seja “tudo ou nada”. O governo federal, por outro lado, desconsidera essa possibilidade e ressalta que a decisão cabe ao Japão. Ainda há tentativas de incluir Acre e Rondônia na lista de Estados a serem autorizados em uma primeira leva.

Um executivo avaliou que o “radicalismo” foi contornado. Outra liderança admitiu que não se pode dispensar aberturas, mesmo que parciais, em momento de tensão comercial e possível perda do mercado dos EUA.

Uma missão do Ministério da Agricultura vai ao Japão para reuniões com autoridades locais na próxima semana. O anúncio oficial, se acertado, poderia ocorrer em novembro, durante visita do primeiro-ministro japonês, Shigeru Ishiba, ao Brasil.

 

Inspeção

 

Em junho, técnicos do Japão realizaram uma auditoria inédita no sistema de inspeção brasileiro, passo considerado fundamental nas negociações. A visita foi marcada para essa data para coincidir com o novo status sanitário do país. Setor e governo argumentam que as barreiras técnicas e sanitárias foram totalmente superadas nas tratativas com os asiáticos.

A auditoria, no entanto, se restringiu aos três Estados do Sul, que já haviam encaminhado documentos ao governo japonês previamente. Os recados enviados de Tóquio são de que uma eventual abertura incluirá apenas os abatedouros dos três Estados, que já tinham o reconhecimento da OMSA antes de 2025. Santa Catarina obteve o status em 2007. Rio Grande do Sul e Paraná em 2021.

Um executivo lembrou que o trânsito de animais e de produtos bovinos já é liberado no país, por conta do status sanitário unificado, e que não há mais diferenças nem barreiras entre os Estados.

O secretário de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura, Luis Rua, disse que o governo vai defender a abertura para o país inteiro, mas não vai recusar a possibilidade de aval parcial. O peso econômico e político dessa conquista também é levado em consideração. O Japão ainda não emitiu o relatório final da auditoria feita no Brasil.

“O pedido sempre é mais amplo. Entendemos que todos os Estados têm o mesmo status sanitário”, disse ao Valor. Ele explicou, porém, que apenas o bloco 1, formado por Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Acre e Rondônia, que encerraram a vacinação contra aftosa mais cedo, está em dia com documentos solicitados pelo Japão.

“Pensando no que é fático, os documentos são desses cinco Estados. Vou entender com minha contraparte japonesa o que eles querem”, acrescentou.

Os Estados do Sul enviaram as documentações antes, com dados de vigilância dos rebanhos e abates, por exemplo. Acre e Rondônia mandaram pouco depois, mas não a tempo de serem incluídos no roteiro da missão técnica em junho. “Os demais Estados e o Distrito Federal não têm documentação lá”, explicou Rua. Ele não descarta a necessidade de outra auditoria in loco para prosseguir com a habilitação dessas unidades.

A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) e a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo) enviaram ofício ontem ao Ministério da Agricultura em que expõem preocupações do setor. Elas pedem que as negociações sejam focadas na aprovação de todo o país.

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