China aumenta interesse no café da África, mas relação com o Brasil se mantém firme, com o consumo crescendo no país asiático — Foto: Gustavo Facanalli/Embrapa
Por Isadora Camargo— São Paulo
Maior produtor e exportador mundial de café, o Brasil vê na China um mercado em crescimento. Mas, para os chineses, não é o único. Um mês atrás, o governo do país asiático retirou tarifas de importação de 53 países da África que produzem café arábica.
A medida, aprovada em junho, amplia o acesso isento de tarifas que antes era restrito aos 33 países africanos, e passou a incluir também as quatro maiores economias do continente: Nigéria, África do Sul, Egito e Argélia.
"A China redesenhou discretamente o mapa do comércio de café", disse a analista do mercado Sarah Charles em um artigo publicado no dia 25 de julho, no site especializado Coffee Inteligence. O anúncio aconteceu durante o encontro ministerial do Fórum de Cooperação China-África (Focac), em Changsha, como noticiado pelo Global Times da China.
A mudança de política comercial com a África é significativa e ocorre em meio às sanções impostas pelo governo de Donald Trump a diversas matérias-primas de dezenas de países. Isso colocaria a China como destino mais atrativo e menos oneroso para as exportações de café do continente africano.
"O consumo de café na China cresceu 21% ao ano desde 2010, superando o crescimento global. Em contrapartida, a União Europeia está a reforçar as regras comerciais, posicionando a China como um comprador sem atritos", escreveu a analista.
Em janeiro de 2024, o Conselho de Estado chinês aprovou um plano nacional para Cooperação Econômica e Comercial China-África. Por meio desta política, a província de Hunan, que está entre as regiões centrais e ocidentais da China, lidera a parceria, como descrito no site do Ministério de Relações Exteriores da China. Em um ano, os embarques de café subiram 197,8% nesta rota.
Historicamente, a África direciona a maior parte de suas exportações de café verde para a Europa e, em menor grau, para os Estados Unidos. Mais recentemente, porém, a Etiópia passou a concentrar suas exportações em mercados asiáticos (54,5%), à frente da Europa (29,5%), segundo dados publicados no Global Times e no site Coffee Inteligence.
O crescimento é um reflexo direto da Lei Antidesmatamento da União Europeia (EUDR), que está a menos de seis meses de vigência, e que atrapalharia as exportações da África para a Europa.
Relação com o Brasil segue firme
Contudo, o interesse da China pelo café de origem africana não atrapalha a relação comercial com o Brasil, porque o consumo cresce em ritmo acelerado no país asiático, ao passo que a agenda de abertura de novos mercados também aumenta.
No momento, o setor produtivo e exportador de café brasileiro antecipa preocupações sobre como redirecionar suas cargas, caso a tarifa total de 50% entre em vigor no dia 6 de agosto. Mesmo assim, o cenário é de especulação, dependendo de fatores macroeconômicos de cumprimento de contratos de exportação e de mudanças nos preços futuros da commodity nas bolsas internacionais.
Enquanto isso, nos Estados Unidos, a entidade mais importante da indústria de café, a NCA (Associação Nacional do Café, na tradução livre), ainda não se posicionou publicamente sobre as sobretaxas sobre o grão do Brasil. A reportagem tentou contato por email, mas não obteve resposta até o momento. Uma fonte do setor disse que não acredita mais na isenção do café e até que o debate entre as contrapartes pode ter enfraquecido em Washington.
O presidente do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), Márcio Ferreira, falou à reportagem que a entidade está mais ativa com a comitiva do governo do Brasil para seguir pressionando autoridades americanas. Ele destaca que nenhuma entidade “jogou a toalha” e esperam uma resposta do governo Trump sobre isenção do café, ou tarifas menores e equivalentes entre origens produtoras do grão.