BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A Marfrig, uma das maiores companhias de carne do mundo, decidiu paralisar a produção de seu complexo de Várzea Grande, em Mato Grosso, destinada aos Estados Unidos.
Conforme informações obtidas pela reportagem, a empresa afirmou ao Mapa (Ministério da Agricultura e Pecuária) que o pedido de paralisação temporária está ligado a motivos comerciais. Não há detalhamento sobre o volume que deixará de ser enviado ao consumidor americano.
De acordo com a empresa, a paralisação da produção destinada ao mercado americano passou a valer no dia 17 de julho. O retorno, que ainda não tem data prevista para ocorrer, deverá ser informado aos órgãos de fiscalização com 72 horas de antecedência.
A unidade de Várzea Grande é uma das mais importantes da companhia no Brasil, reunindo operações de abate e processamento industrial de carne bovina.
Instalada no complexo adquirido da BRF em 2019, a planta foi reativada com um investimento inicial de cerca de R$ 100 milhões e desde então passou por ampliação.
A capacidade de processamento atual da unidade é de aproximadamente 2.000 cabeças de gado por dia, com produção de alimentos processados de cerca de 70 mil toneladas ao ano.
Na unidade, a Marfrig faz abate, desossa e industrialização de produtos. O local está habilitado para exportar para 22 países, incluindo China e Europa, além dos Estados Unidos.
A paralisação das remessas para os EUA pode levar a empresa a reorientar sua produção para outros destinos, enquanto o impasse sobre a sobretaxa de 50% imposta pelo presidente Donald Trump não se resolve.
A CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) calcula que o agronegócio deixará de exportar US$ 5,8 bilhões aos EUA com a sobretaxa de 50% anunciada por Donald Trump sobre os produtos brasileiros. O valor representaria uma queda de 48% nas exportações de produtos destinados ao mercado norte-americano em comparação com 2024.
Carnes bovinas devem ter uma queda estimada de 47%, enquanto o café pode ter uma redução de 25%, caso a sobretaxa se confirme. O cálculo é baseado na elasticidade das importações dos Estados Unidos, considerando a tarifa de 50%, que mede o quanto a quantidade importada reage a mudanças no preço dos produtos importados.
"Assumiu-se que o choque causado nas tarifas seria integralmente transmitido para os preços de importação. Ou seja, uma elevação de 50% nas tarifas elevaria em 50% os preços finais", afirma a CNA em nota.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, as tarifas extras já impostas pelo presidente dos Estados Unidos derrubaram a venda de carne bovina brasileira para os americanos, mesmo antes de entrar em vigor a sobretaxa de 50%, prevista para valer a partir de 1º de agosto.
Em abril, mês em que Trump passou a impor a taxação adicional de 10%, as exportações brasileiras de carne para os EUA chegaram a 47,8 mil toneladas, conforme dados do comércio bilateral são do Mdic (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços).
Em menos de três meses, porém, o volume despencou: foram registradas vendas de 27,4 mil toneladas em maio. Em junho, houve uma nova redução, para 18,2 mil toneladas. Neste mês, mais um tombo, e o volume das compras americanas chega a 9,7 mil toneladas neste momento, uma redução de 80% sobre as exportações de abril.
Em curva oposta, embora bem menos acentuada, o preço da carne brasileira subiu para o mercado americano. Se em abril o valor médio pago pelo importador era de US$ 5.200 por tonelada de carne, esse preço passou para US$ 5.400 em maio e chegou a US$ 5.600 em junho. Nesta semana, o valor médio praticado está em US$ 5.850, uma alta de 12%.
Com a incerteza do que pode ocorrer a partir de agosto, algumas remessas de carne já fechadas e que tinham os EUA como destino chegaram a trocar o destino portuário em território americano, para evitar que a embarcação chegasse após o dia 1º.
Nos últimos dias, frigoríficos de Mato Grosso do Sul suspenderam a produção de carnes destinadas aos Estados Unidos. À Folha o vice-presidente do Sincadems (Sindicato das Indústrias de Frios, Carnes e Derivados de Mato Grosso do Sul), Alberto Sérgio Capucci, explicou que a medida foi tomada para evitar o acúmulo de estoques e que essa é uma tendência nacional, porque algumas das exportações devem chegar aos Estados Unidos somente em agosto, quando as tarifas já devem ser aplicadas pelo governo norte-americano.
O Brasil é hoje o maior exportador de carne bovina para os EUA, seguido por Austrália, Nova Zelândia e Uruguai. Paralelamente, os americanos são o segundo maior destino da carne brasileira, só atrás da China.
As vendas de carne para os EUA seguiam em níveis recordes até o início deste ano. De janeiro a junho de 2025, o Brasil exportou 181,5 mil toneladas de carne bovina para os Estados Unidos, com faturamento de US$ 1,04 bilhão no período.
O resultado representa um crescimento de 112,6% em volume e 102% em valor em relação ao mesmo período de 2024, quando foram exportadas 85,4 mil toneladas, totalizando US$ 515 milhões. O preço médio brasileiro ainda está abaixo da média de exportadores como o Canadá e Argentina, mas essa situação mudaria drasticamente com a sobretaxa de 50% ameaçada por Trump.